sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A versão do ex-terrorista

Pivô de uma ruidosa crise diplomática entre Brasil e Itália, o ex-guerrilheiro Cesare Battisti rompe o silêncio, revela surpresa com repercussão de seu caso e responde, pela primeira vez, a ataques de críticos e do governo de seu país


A camiseta amarela e a calça jeans não poderiam estar mais surradas. Dificilmente também poderiam estar mais limpas. Mesmo sob forte escolta policial e algemado, ao descer da parte de trás do camburão, o italiano Cesare Battisti passava uma imagem de dignidade. Na tarde da quartafeira 28, ele foi retirado da cela que divide com um austríaco preso por crimes fiscais para ser entrevistado por ISTOÉ, na penitenciária da Papuda, em Brasília. Circulou pouco mais de um quilômetro dentro do complexo, sede de uma antiga fazenda, até ser instalado numa sala da gerência de operações especiais. Do lado de fora, a segurança envolvia homens com metralhadoras. Dentro da sala, dois agentes também armados mantiveram-se quase em posição de sentido por 1h40. Eles só se agitaram aos 50 minutos da entrevista, quando um dos advogados de Battisti, Fabio Antinoro, colocou na mesinha que separava o preso da repórter dois copos de água - de vidro. Assim que percebeu o movimento dos agentes, o próprio Antinoro rapidamente trocou o copo de Battisti por um outro, de plástico. Sem nenhum outro comentário ou expressão de desagrado, o italiano agradeceu.Cesare Battisti, um homem de 54 anos com aparência frágil, é o pivô da mais ruidosa crise diplomática enfrentada pelo Brasil nos últimos anos. Será ele um assassino frio, cruel, responsável pelas mortes de quatro pessoas durante os anos de chumbo da Itália? Ou apenas um ex-guerrilheiro arrependido, que não executou nem participou do planejamento dos crimes que lhe são atribuídos? Culpado ou inocente, Battisti se transformou no protagonista de um conflito inédito e explosivo entre dois países amigos - Brasil e Itália - e também de uma trama internacional, que envolve até o serviço secreto francês e a primeiradama daquele país, a cantora italiana Carla Bruni. Em meio ao turbilhão de versões, desmentidos e insinuações, Battisti disse à ISTOÉ, na quarta-feira 28: "Nunca matei ninguém e o refúgio concedido pelo Brasil foi um ato de coragem e humanidade do ministro Tarso Genro."





Com aparência serena - mesclada por momentos de ansiedade contida -, Battisti não se exaltou em nenhum momento. Chegou a rir quando lembrado que, três décadas atrás, usava um documento falso com o sobrenome Ferrari. "Eu já tinha me esquecido", disse. "Era Joseph Ferrari." Quanto à vida na Papuda, conta que tem boa convivência com os 50 presos de sua unidade - um deles faz graciosamente o corte de seus cabelos. Em vez de participar das atividades laborais oferecidas pela Papuda, Battisti prefere continuar sua própria obra literária e passa a maior parte do tempo tentando escrever. Conta que já recebeu "centenas" de cartas, de todo o mundo, de pessoas oferecendo-lhe apoio.



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